Pontuação |
A pontuação foi inventada na Idade Antiga. A necessidade de transmissão da escrita leva gramáticos como Aristófanes de Bizâncio (século III aC) a estabelecer regras para a edição de textos importantes e pensar em um sistema de pontuação - já com o ponto (stigmè) em destaque. Pouco aplicada, essa pontuação era utilizada principalmente para balizar textos para o ensino da leitura ou uso pessoal.
No alvorecer da Idade Média, as Sagradas Escrituras apresentam um novo desafio : em um mundo em que o latim se deteriora, quando não é, mais ao norte, uma língua estrangeira, sua legibilidade exige mais esforço. Ao século de Carlos Magno, os textos antigos são copiados em grande escala, o que leva, sob a liderança de Alcuin, a uma racionalização da pontuação. Aos antigos signos chamados distinctiones, marcando as unidades de sentido, são acrescentados os signos denominados positurae, observando as pausas e inflexões vocais indispensáveis à liturgia.
A atual fisionomia dos signos resulta de uma dupla evolução : os humanistas, que refinam a pontuação, e a imprensa. A pontuação iria torna-se um privilégio de impressores, às vezes em detrimento dos autores. 1
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O ponto |
Quando em 1540, Etienne Dolet no seu tratado de pontuação precisa que o ponto sou põe-se em fim de frase e nunca em outro lado, sua insistência não é exagerada. Porque o ponto (a origem da palavra pontuação) passeou em toda a frase. No sistema á Idade Média, o ponto muda de significação segundo a sua altura. Em baixo (pontuação fraca), a meia-altura (pontuação mediana), em cima (pontuação forte). Mas, as alturas não eram sempre legíveis.
Ponto alto, ponto médio e ponto baixo (pormenor)
Por isso, a Idade Média criou dispositivos complementares. Assim, o punctus versus (um sósia do nosso ponto vírgula) substituiu se frequentemente ao ponto alto (forte) para concluir uma frase.
Punctus versus usado como ponto final.
Século XII
A partir do século XII, a significação do ponto depende menos da sua altura e mais da letra que o segue : uma minúscula e o ponto é fraco, uma maiúscula e o ponto é forte (falamos hoje de ponto final). As bodas do ponto e da maiúscula deram a época do Renascimento o ponto que conhecemos.
A vírgula |
A vírgula nasceu também para não confundir a altura do ponto. A escrituras do século XIII usam uma barra oblíqua para a pontuação fraca, chamada virgula suspensiva, que evita toda confusão com outro sinal. Talvez a inspirou a diastola, a barra que separava duas letras soldadas por erro. O sucesso desta virgula rígida durou até ao século XVII devido a sua diferencia e sua complementaridade evidentes com o ponto. Foi em Itália ao século XV que ela desceu e arredondou-se para dar a nossa vírgula.
O tratado da pontuação de Etienne Dolet.
A edição de 1542 usa a virgula suspensiva.A edição de 1540 usa a vírgula arredondada
O ponto e vírgula |
O ponto e vírgula é um instrumento de precisão. Mas em verdade, ele se faz raro numa época que valoriza as frases curtas e eficazes.
Para um novice, os textos da Idade Média parecem cheios de pontos e vírgulas, muitos bem reconhecíveis. Mas o ponto e vírgula não existia oficialmente porque aparecera só ao início do século XVI. A fisionomia do sinal existia desde o século VIII, com valores diferentes. Era o punctus versus, pontuação final forte, que designava uma chuta da voz e era mesmo igual ao nosso ponte final. Por isso, era omnipresente. Para acrescentar a confusão, o ponto e vírgula servia também a resumir a terminações latinas (escrevia se at; para atque ou partib; para partibus...).
Assento de baptismo de 1722.
O ponto e vírgula serve para abreviar baptisei em bap;
Os primeiros impressores o chamavam "pequeno-qué" (por causa da terminação "que"). Enfim, deve-se lembrar que o ponto e vírgula servia de ponte de interrogação em grego.
O ponto e vírgula moderno data de 1495 quando foi imprimido o De AEtna do humanista Pietro Bembo. Seu impressor, o veniciano Alde Manuce, é o verdadeiro introdutor do sinal. Seu neto, Alde o moço, no seu tratado Epitome orthographiae (1575) admite que o ponto e vírgula é o sinal o mais difícil ("inter omnes notas [...] esse omnium difficillimam"). Ele explica que era necessário um sinal para marcar uma separação intermediária entre os dois pontos ("o que atrasa muito a frase") e a vírgula ("insuficiente"). Notamos a preocupação com uma calibragem muito precisa do peso de cada sinal.
De AEtna (1495) de Pietro Bembo
Primeiro aparecimento do ponto e vírgula actual.
Linha 4, vê-se também um ponto e vírgula abreviativo (deniq; para denique)
Resultando dos humanistas italianos, foi disseminado pela influencia da imprensa veniciana. Esses humanistas imitam a elegância e eloquência dos autores antigos de novo descobridos. Sem recusar a sua lógica, pedem a pontuação de revelar visualmente, para uma leitura silenciosa, a arquitectura oratória da frase com todas as suas articulações. Usam sinais existentes como o ponto, a virgula suspensiva (uma barra), o punctus elevatus e para separar esses dois sinais, uma virgula suspensiva apontada (uma barra com um ponto no meio). Segundo o historiador Malcom B. Parkes, seria esta antiga virgula suspensiva apontada que transposaram Pietro Bembo e Alde Manuce em o nosso ponto e vírgula moderno. O punctus versus ao qual foi usurpado a forma já não era usado pelos copistas italianos desta época.
Virgula suspensiva apontada Itália, 1399
Outros sinais |
O ponto de interrogação
A Idade Antiga não conhecia este sinal. Usava partículas ou advérbios interrogativos para as perguntas. O ponto de interrogação carolíngio faz parte do sistema de pontuação nascido no século VIII : as positurae marcavam as inflexões melódicas e as pausas oratórias da voz em textos destinados à liturgia ou declamação.
Essas positurae desapareceram do repertório das pontuações atuais. O punctus interrogativus é a única positura que sobreviveu intacta por doze séculos ; a imprensa se contentara em endireitá-la e arredondá-la. Não tendo nenhuma ambigüidade, até foi adotada por línguas não ocidentais. Hoje seu uso é planetário, com suas variantes ou adaptações. Como, por exemplo, o ponto invertido (¿) ibérico, anunciando o início de uma questão, resultante de uma recomendação de 1754 da Real Academia Espanhola.
O ponto de exclamação
Se os sinais tivessem nacionalidade, o ponto de exclamação seria italiano. Por volta de 1360, o autor de uma Ars punctuandi (arte da pontuação) afirmava ser o inventor do punctus admirativus, barra inclinada para a direita, com dois pontos alinhados abaixo. Este símbolo seria inspirado em seu duplo, o scandicus, notação musical primitiva (neuma), marcando notas ascendentes. Esses sinais musicais eram gráficos conhecidos, já que os cantores aprendiam de cor as pinturas de neuma, reproduzidas em diversos manuscritos de século em século.
As reticências
As reticências foram popularizadas no início do século XVII pelo teatro impresso. É a solução tipográfica encontrada pelos editores para representar a interrupção de um diálogo. No século XVIII, este "ponto de omissão" ou "ponto de interrupção" ainda pode contar mais de três pontos. O inglês encontra um pouco de ar estranho neste signo, já que um de seus nomes é French dots ; ele prefere o traço a eles.
O sinal é rapidamente adotado. Não é raro que essa série de pontos seja usada de forma sugestiva, como um artifício de autocensura que deixa a imaginação do leitor livre.
Os dois-pontos
O ponto duplo é um dos sinais mais antigos. Foi usado como pontuação forte na Idade Antiga. O sinal que conhecemos deriva do punctus elevatus medieval (ponto encimado por um acento agudo), que inicialmente marcava uma separação mediana entre duas frases com significado em si, mas que precisavam ser conectadas para formar um significado completo. Pertencia ao sistema das positurae.
Permaneceu por muito tempo o único sinal de separação mediana (antes da aclimatação do ponto e vírgula). No século XVIII, ele se especializou no papél de anunciar ou enunciar. Assim ganhou em precisão, graças a uma divisão de tarefas com o ponto e vírgula.
Fontes |
1 Este artigo é um resumo meu de uma série de artigos "Le point sur... la ponctuation" que sairam na revista L'Express (Pedro Uribe Echeverria, 2009). Leia o artigo completo (em francês).